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sexta-feira, junho 04, 2010

História das Copas: 1994 nos Estados Unidos

Era uma (primeira) vez na América
Sob um calor de rachar e num país que não estava nem aí para a Copa, o Brasil voltou a vencer



Resumo da Copa
Campeão:
Brasil Vice: Itália 3º lugar: Suécia 4º lugar: Bulgária
Os artilheiros
Oleg Salenko (RUS) 6 gols
Hristo Stoichkov (BUL) 6 gols
Kennet Andersson (SWE) 5 gols
Romário (BRA) 5 gols
Jürgen Klinsmann (GER) 5 gols
Roberto Baggio (ITA) 5 gols
Os melhores da Copa pela FIFA
Romário (BRA)
Roberto Baggio (ITA)
Hristo Stoichkov (BUL)
Sedes
Boston (Foxboro), Chicago, Dallas, Detroit (Pontiac), Los Angeles (Pasadena), Nova York/Nova Jersey (East Rutherford), Orlando, San Francisco (Stanford), Washington D.C.
Países participantes (24)
Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Bélgica, Bolívia, BRASIL, Bulgária, Camarões, Colômbia, Coreia do Sul, Espanha, Estados Unidos, Grécia, Holanda, Irlanda, Itália, Marrocos, México, Nigéria, Noruega, Romênia, Rússia, Suécia e Suíça
Público total: 3.587.538 Jogos: 52 Gols: 171 Média de gols: 2,67

A Copa
O século 20 estabeleceu um parâmetro peculiar para o conceito de “fazer sucesso”. Mesmo que meio a contragosto, o mundo parece seguir uma convenção não-escrita segundo a qual nada é considerado verdadeiramente triunfante até fazer sucesso nos Estados Unidos. Os Beatles só passaram a ser os Beatles – ou só deixaram de ser uma banda britânica – depois de 1964, quando fizeram mais de 70 milhões de telespectadores americanos se chacoalharem enquanto assistiam ao Ed Sullivan Show. Os Estados Unidos são como uma fronteira decisiva de aceitação (e grana) para quem vem de fora, e o futebol é o provavelmente o exemplo mais claro disso.

Após 64 anos organizando um evento que cresce geometricamente em tamanho e faturamento, a FIFA marchou rumo ao oeste, para tentar convencer os EUA de que soccer não é coisa de garotas universitárias. A candidatura americana derrotou Brasil e Marrocos e impôs um desafio: realizar o Mundial num pais gigantesco e, principalmente, cuja população não está nem aí para o torneio. Os resultados estão longe de ser gloriosos e revolucionários, mas também não foram tão pálidos como a final entre Brasil e Itália – a única sem gols na história – faz crer.

Não havia o tal “clima de Copa do Mundo”, e os americanos não se apaixonaram loucamente pelo futebol; isso é fato. Mas, com seus altos e baixos, a MLS (Major League Soccer) - a liga nacional criada no embalo da Copa - sobreviveu e se estabeleceu. Os enormes estádios do país registraram o maior público total da história das Copas e também a maior média. Dentro de campo, a marca de 2,67 gols por jogo foi a maior desde 1982 e não foi superada em nenhuma das edições posteriores a 1994. No saldo geral, não dá para dizer que tenha sido assim uma excursão dos Beatles, mas, de alguma maneira, aconteceu: discretamente, saltando o arame farpado, o futebol conseguiu cruzar a fronteira e entrar na terra das oportunidades.

Curiosidades
- Um jogo, dois recordes

Rússia x Camarões, ultima rodada da primeira fase, sol de rachar. Os russos já estavam eliminados e os camaroneses, quase. Tudo montado para um marasmo danado e eis que aparece Oleg Salenko. O até então obscuro atacante do Logroñés entrou para história ao marcar cinco dos seis gols da Rússia na goleada por 6 x 1 – um recorde. Pobres dos africanos, certo? Nada! Também teve festa em Iaundé graças ao gol de honra, marcado por Roger Milla. O ídolo camaronês conseguiu um recorde para ele também: aos 42 anos, se tornou o jogador mais velho a marcar um gol em Copas.

- Estupidez Fútbol Club
Favoritismo exagerado + país subdesenvolvido e violento + derrota para os Estados Unidos + gol contra + porta de boate em Medellín. O caso do colombiano Andrés Escobar juntou ingredientes peculiares, que resultaram num fim inacreditavelmente trágico. Após um desempenho histórico nas Eliminatórias, a Colômbia era sido apontada como favorita ao título por muitos, até (?) por Pelé. Mas, com sua segunda derrota na Copa - 2 x 1 para os EUA, com gol contra de Escobar – a equipe acabou eliminada na primeira fase. Dez dias depois da decepção, de volta a Medellín, Escobar estava na porta de uma casa noturna quando um certo Humberto Muñoz Castro desatou a provocá-lo, citando o ocorrido na Copa. Escobar se ofendeu e reagiu. Levou 12 tiros por todo o corpo e morreu a caminho do hospital.

- Here comes the sun
Um dos dramas de uma Copa do Mundo realizada tão a oeste do Meridiano de Greenwich foi adaptar os horários das partidas para a grade televisiva da Europa e da Ásia – onde está a maioria dos telespectadores. Quem pagou o pato (assado) foram os atletas: em pleno verão americano, 32 dos 52 jogos começaram entre as 11h30 e as 15h locais, quando as temperaturas costumavam passar brincando dos 35ºC.

- Obrigado, volte sempre
Três seleções disputaram nos Estados Unidos a primeira Copa do Mundo de suas vidas. A Nigéria caiu nas oitavas diante da Itália, na prorrogação, depois de ter sido uma das sensações da primeira fase - quando liderou o grupo que tinha Argentina e Bulgária. Amunike, Okocha, Amokachi e cia. eram a base da equipe que seria campeã olímpica dois anos depois, em Atlanta. A Arábia Saudita também se classificou para a segunda fase, graças em boa parte ao gol mais bonito do Mundial: Saeed Owairan arrancou da metade do campo, driblou meio time da Bélgica e deu a vitória por 1 x 0. Os sauditas acabaram derrotados pelos suecos por 3 x 1 nas oitavas. Só quem decepcionou foi a Grécia: três jogos, três derrotas, dez gols sofridos e nem unzinho marcado.

- McAlá Feliz
Com toda a boa intenção do mundo (ou seja, a de vender junk food), dois dos patrocinadores da Copa do Mundo, McDonald’s e Coca-Cola, ilustraram suas caixinhas de lanche e latinhas de refrigerante com as bandeiras dos 24 países participantes. Tudo muito simpático, a não ser pelo fato de que a bandeira da Arábia Saudita ostenta uma declaração islâmica de fé, e os próceres sauditas não gostaram nada de ver seu símbolo sagrado sendo atirado no lixo, amassado e cheio de ketchup. Os produtos tiveram que sair de linha imediatamente.

- Football no. Soccer
Difícil ver uma Copa do Mundo com tantas novidades como a dos Estados Unidos em 1994. Foi a primeira vez que o os jogadores passaram a ter seus nomes escritos na parte de trás da camiseta (como nos esportes americanos) e também a primeira edição em que uma vitória na fase de grupos valeu três pontos, e não dois. O empate de 1 x 1 entre EUA e Suíça, no Pontiac Silverdome, foi também o primeiro jogo de Copa disputado em um estádio coberto.

- Adiós, muchacho
Alguns dias de Copa do Mundo foram o microcosmo da carreira atribulada de Diego Maradona. Primeiro a ascensão meteórica: por ter sido convocado, por ter entrado em forma e por ter feito um partidaço, com direito a um belo gol, nos 4 x 0 contra a Grécia, na estreia argentina. No segundo jogo, a queda vertiginosa: os argentinos bateram a Nigéria por 2 x 1, e Maradona saiu de campo tranquilo, de mãos dadas com a oficial que o levaria ao exame antidoping. Mal sabia ele que eram seus últimos passos dentro de um gramado numa competição internacional. Aquele exame acusou a presença de cinco variantes da efedrina, um estimulante usado em remédios para controle do peso. Maradona foi a público e, às lágrimas, acusou o establishment futebolístico de estar “cortando suas pernas”. Por corte de quem quer que seja, dele mesmo ou dos outros, o fato é que ali acabou o Mundial para os argentinos e também a carreira internacional de Diego.

- Todos por todos, todos por um
Desde a goleada por 6 x 0 sobre a Bolívia nas Eliminatórias, em Recife, a Seleção Brasileira adotou uma forma explícita de mostrar como permanecia unida, a despeito da pressão que vinha de fora: os jogadores entravam no campo de mãos dadas. E, imediatamente após a conquista, veio a homenagem que deixou torcedores e Galvões Buenos ensandecidos de amor à pátria: uma enorme faixa lembrando Ayrton Senna, morto dois meses e meio antes, num acidente no circuito de Imola, em San Marino.

E o Brasil?
Para os brasileiros, a imagem de 1994 como um Mundial sem-graça decerto tem menos a ver com a falta de ambiente festivo nos EUA do que com a falta de futebol atraente da Seleção Brasileira. Sem ganhar uma Copa desde 1970 e ainda sentindo as sequelas causadas pela equipe de Sebastião Lazaroni quatro anos antes, o Brasil chegou aos Estados Unidos sob pressão.

Carlos Alberto Parreira passou boa parte das Eliminatórias equilibrando-se em cima do telhado. Fechava os olhos e o fundo de sua cabeça gritava “olê, olê, olê / Telê, Telê”, ou ainda “Romário! Romário!”. Esse segundo grito ele escutou, e foi por causa da presença (e dos dois gols) do Baixinho no último jogo das Eliminatórias – contra o Uruguai, no Maracanã – que o Brasil se classificou.

O peso do ambiente é a explicação que Parreira sepre usou para o futebol cauteloso que jogava aquele Brasil. Era preciso vencer e, para isso, o mais garantido era, antes de tudo, sofrer o mínimo de gols possível. Depois, lá na frente, que o talento de Bebeto e Romário – e quase só dos dois - nos livrasse.

Goste-se ou não, deu certo. A Seleção perdeu um punhado de zagueiros (Mozer e Ricardo Gomes, cortados, e Ricardo Rocha, lesionado na estreia) e ainda assim teve na dupla Aldair e Márcio Santos um de seus pontos altos. Raí, provavelmente o melhor jogador brasileiro nos cinco anos anteriores à Copa, decepcionou, perdeu a vaga de titular (para um jogador mais defensivo, Mazinho) e ainda assim o time seguiu em frente.
Leonardo, provavelmente o jogador de futebol mais ponderado e esclarecido que o Pais já produziu, teve um décimo de segundo de troglodita, acertou uma cotovelada em Tab Ramos (EUA) nas oitavas-de-final e foi suspenso pelo restante da Copa. Seu substituto, Branco, marcou o gol da vitória na melhor partida de que a Seleção participou – os 3 x 2 sobre a Holanda nas quartas-de-final.

A vida, enfim, não foi fácil para o time que, apesar de saber que dependia enormemente do talento de um só jogador, Romário, sabia também, por experiência própria, que o grupo todo devia caminhar no mesmo sentido – ainda que fosse o do pragmatismo contestado de Parreira. Na medida em que os anos passam, cada vez mais o que permanece para a história são somente os fatos, secos: a Seleção de Parreira ganhou o quarto título mundial e isolou o Brasil como maior vencedor das Copas.

A Campanha do Brasil
Primeira fase

20/06/1994 BRASIL 2 X 0 Rússia (BRA: Romário 26"/1° e Raí 7"/2°) - San Francisco
24/06/1994 BRASIL 3 X 0 Camarões (BRA: Romário 39"/1°, Márcio Santos 21"/2° e Bebeto 28"/2°) - San Francisco
28/06/1994 BRASIL 1 X 1 Suécia (BRA: Romário 1"/2°; SUE: Kennet Andersson 23"/1°) - Detroit

Oitavas-de-final
04/07/1994 BRASIL 1 X 0 EUA (BRA: Bebeto 27"/2°) - San Francisco

Quartas-de-final
09/07/1994 BRASIL 3 X 2 Holanda (BRA: Romário 8"/2°, Bebeto 18"/2° e Branco 36"/2°; HOL: Bergkamp 19"/2° e Winter 31"/2°) - Dallas

Semifinal
13/07/1994 BRASIL 1 X 0 Suécia (BRA: Romário 35"/2°) - Los Angeles

A Final
17/07/1994 BRASIL (3) 0 X 0 (2) Itália (BRA: Romário, Branco e Dunga; ITA: Albertini e Evani) - Los Angeles

BRASIL
Taffarel, Jorginho (Cafu 21’ do 1º), Aldair, Márcio Santos e Branco; Mauro Silva, Dunga, Mazinho e Zinho (Viola 1’ do 2º tempo da prorrogação); Bebeto e Romário. Técnico: Carlos Alberto Parreira
Itália
Pagliuca, Benarrivo, Mussi (Apolloni 35’ do 1º), Baresi e Maldini; Dino Baggio (Evani 5’ do 1º tempo da prorrogação), Berti, Albertini e Donadoni; Baggio e Massaro. Técnico: Arrigo Sacchi

Fonte: IG

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